GRATIDÃO E COMPROMISSO COM RUDOLF STEINER
por Joan Antoni Melé
por Joan Antoni Melé
Cem anos acabam de ser cumpridos desde que Rudolf Steiner realizou o Congresso de Natal e, por meio dele, foi fundada a Sociedade Antroposófica Geral. Traz-nos esperança o fato de que em muitas partes do mundo este evento tenha servido para revisitar o significado e o alcance deste Congresso, e também para perguntar por que algo de transcendental importância tenha sido tão pouco e mal compreendido.
Uma das vantagens em estudar a vida e a obra de Rudolf Steiner, um dos grandes iniciados da humanidade, é sua extrema precisão na fala. Não adianta especular sobre ele, quando lemos alguns de seus textos e não compreendemos completamente o significado de suas palavras, pensando que "... talvez ele quisesse dizer...", ou "... não devemos levá- lo ao pé da letra..." Ele dizia o que queria dizer, e as interpretações não são válidas. Rudolf Steiner chamou o Congresso de Natal com a mesma expressão do Mistério do Gólgota: "a transição dos tempos", isto é, um momento culminante na evolução da humanidade.
Em 1904, no contexto de uma palestra para membros da Maçonaria, Rudolf Steiner falou do "Templo a ser reconstruído". A reconstrução do Templo perdido, bem como a reunificação da ciência, arte e religião, eram os ideais da Maçonaria original, de inspiração Rosacruz. Embora Rudolf Steiner também tenha construído um templo físico, o Primeiro Goetheanum, como o novo templo do Graal, esse antigo ideal da reconstrução se referia, em nossa época, ao novo “Templo invisível da humanidade”.
Um templo é um lugar onde o divino encontra o humano, especialmente os templos iniciáticos. A partir desses encontros cósmico-humanos, essa sabedoria divina poderia fluir para o mundo a fim de guiar a humanidade em seu caminho terreno livre. Acredito que não seria exagero dizer que os últimos templos visíveis (com exceção do Primeiro Goetheanum) procedentes de um conhecimento iniciático, foram as catedrais góticas. A partir daí, houve um grande vazio no conhecimento iniciático, porque a humanidade teve que mergulhar gradualmente em uma era de trevas e materialismo, como parte de seu caminho para a liberdade.
Durante os primeiros 21 anos da antroposofia, Rudolf Steiner começou a construir o Novo Templo, transformando progressivamente a Ciência, a Arte e a Religião. Ele pôde fazer este trabalho titânico como o Grande Mestre da Humanidade, porque no final do século passado, quando terminava o Kali Yuga, ele teve um encontro sagrado, nas profundezas de sua alma, com o ser do Cristo no Mistério do Gólgota. A partir desse momento, sacrifica o seu "eu" ao Cristo, e assim se torna permeado precisamente pelo "Eu" de Cristo, pelo verdadeiro "Eu" da humanidade. Similar ao que São Paulo fez, a partir daquele momento ele pôde dizer: "Não eu, mas Cristo em mim".
No primeiro período de sete anos, entre 1902 e 1909, Steiner transformou completamente a Ciência convencional, unindo pensamentos humanos com pensamentos cósmicos. Nessa época ele nos transmitiu todo o seu conhecimento vivido ao longo dos anos, e culminou com o livro A Ciência Oculta, que foi escrito em 1909, embora publicado em 1910. Ele foi capaz de fazer essa união porque em seu caminho iniciático pessoal ele subiu ao nível da Terceira Hierarquia, que rege o mundo do pensamento humano. Podemos criar uma imagem que nos permite compreendê-la: a cúpula da cabeça humana presa à cúpula do cosmos, uma cúpula dupla que mais tarde foi vista em forma real no Primeiro Goetheanum.
No segundo período de sete anos, entre 1909 e 1916, transforma o mundo da arte, não só renovando as velhas artes, mas criando algumas novas: Euritmia, Arte da Fala, Dramas de Mistério, o Primeiro Goetheanum... Foi também o momento em que iniciou seus ciclos sobre Cristologia, que também devem ser entendidos como parte do trabalho artístico, já que são especialmente imaginativos. Nesta segunda etapa da construção do Templo suprassensível, Rudolf Steiner uniu as Imaginações Cósmicas da Segunda Hierarquia com imagens humanas, e então foi capaz de fazê-lo porque em seu caminho iniciático pessoal ele havia se elevado a esse nível espiritual. Se quisermos também formar uma imagem representativa desse período, podemos imaginá-lo como a construção das colunas e capitéis do Templo, que mais tarde também se tornou visível no Primeiro Goetheanum.
Finalmente, entre 1916 e 1923, consolida os alicerces ou a base do Templo, unindo o Amor Cósmico da Primeira Hierarquia, que é aquela que cria os mundos, com o Amor humano que cria atividades novas renovadoras na Terra. É, acima de tudo, a época da Trimembração Social e da Pedagogia Waldorf, um verdadeiro impulso de amor para renovar todo o organismo social. Dentro dos ideais maçônicos que citamos, podemos considerar essa época como de renovação da Religião, no sentido de que a vida social humana pode finalmente ser "religada" com o divino. Conseguiu realizar esta terceira etapa porque no seu caminho de evolução pessoal, ele também ascendeu ao nível da Primeira Hierarquia, ligada ao amor criador dos mundos.
O suprassensível Novo Templo de Mistério havia sido construído, assim como o visível, Primeiro Goetheanum, embora tenha sido destruído por um incêndio criminoso em 31 de dezembro de 1922. Mas, assim como nos tempos antigos, para que ele se tornasse verdadeiramente um Templo Iniciático de Mistérios, esse Templo tinha que ser consagrado. A consagração do Templo só podia ser realizada pelos principais sacerdotes ou hierofantes, e consistia em um sacrifício e uma promessa. Naquela época, costumava-se sacrificar o melhor animal ou o melhor produto de uma colheita, e o sacerdote fazia uma promessa ao mundo espiritual de que acompanharia as pessoas ligadas àquele templo para que elas pudessem realmente fazer um caminho certo na Terra.
O Congresso de Natal de 1923-24, no qual foi fundada a nova Sociedade Antroposófica Geral, tornou-se o ato de consagração daquele templo suprassensível que Rudolf Steiner vinha construindo ao longo de 21 anos. Ele também fez uma promessa de fidelidade inabalável ao mundo espiritual, acompanhada pelo sacrifício inimaginável de ligar para sempre seu carma pessoal com o carma dos membros da Sociedade Antroposófica. Esse Congresso formou a base para uma "Nova Aliança" entre os seres humanos e as Hierarquias, seres humanos que desejam livremente fazer parte daquele Templo, para curar a ferida que vinha se formando há milênios, separando o mundo físico do mundo espiritual.
Quando contemplamos a vida sacrificial de RudolfSteinerpelaevoluçãodahumanidade, além de uma profunda surpresa, respeito e admiração, naturalmente surge um sentimento de enorme gratidão. Das profundezas da alma vêm as palavras: "Obrigado, Mestre, por toda a sua vida de amor e dedicação abnegada". Mas qual é a única maneira real de agradecer a Rudolf Steiner? Em minha opinião, a única maneira real de agradecê-lo é dizer: "Eu também me comprometo incondicionalmente, inabalavelmente e eternamente com esta Comunidade da Sociedade Antroposófica, para que através de mim, através de nós, os impulsos necessários possam chegar ao mundo para que possamos cumprir 'os fins eternos dos Deuses', aquelas metas que eles planejaram para que nós, seres humanos, possamos realizar plenamente nosso propósito na Terra, ou seja, para que possamos nos tornar "plenamente humanos". Comprometer-se com essa Comunidade significa, além do trabalho espiritual individual, especialmente com a Meditação da Pedra Fundamental, apoiar a Sociedade Antroposófica espiritualmente, animicamente e economicamente. Comprometer-se com a Comunidade significa ajudar a criar vínculos entre os ramos, as sociedades territoriais e o Goetheanum, bem como entre as diversas Seções de Pedagogia, de Medicina, de Ciências Sociais, de Agricultura, e outras.
Hoje existem milhares de pessoas que trabalham em alguma atividade antroposófica, mas que não têm interesse em fazer parte da Sociedade Antroposófica. Há também muitos que, fazendo parte da Sociedade, não lhe dão qualquer contribuição financeira ou, se o fazem, é de valor mínimo. O dinheiro é uma das formas de expressar a vontade, e o dinheiro com que contribuímos hoje para as sociedades territoriais e para o Goetheanum é insuficiente para manter uma vida saudável para a Sociedade Antroposófica. Convido cada um a pensar no valor do que recebemos de Rudolf Steiner e a repensar que parte dos nossos rendimentos queremos dedicar àquela Comunidade que ele fundou, comprometendo toda a sua vida.
O mundo espiritual nos fez um triplo chamado cheio de amor e preocupação, para enfrentarmos juntos os momentos difíceis que virão.
Que os homens queiram ouvi-lo!