NATAL
por Maria Cecilia Moraes Antunes
por Maria Cecilia Moraes Antunes
Se quisermos festejar o Natal de modo Cristão, deve existir em nós mesmos, um pastor e um rei. Um pastor que ouve o que as outras pessoas não ouvem, e que com todas as formas da dedicação mora logo abaixo do céu estrelado. A esse pastor, anjos anseiam por revelar-se. E um rei que distribui dádivas, que não se deixa guiar por nada mais a não ser pela estrela das alturas. E que se põe a caminho para ofertar suas dádivas ao pé de uma manjedoura. Mas além do pastor e do rei deve existir em nós também uma criança que quer nascer agora.
Rudolf Steiner
O pilar da Festa do Natal se repete anualmente fazendo fluir para a Alma impulsos potencialmente curadores. Em sua conferência sobre o Natal proferida em 1918, traduzida como “O Nascimento do Cristo na Alma Humana”, Rudolf Steiner fala destes impulsos de forma muito bela, nos trazendo esclarecimentos fortalecedores e importantes no tocante ao evento Natalino.
Nesta conferência Steiner menciona “...Para que possamos sempre nos lembrar de nossa origem espiritual, para que possamos crescer fortes no pensamento de que viajamos do espírito para o mundo físico - é por esta razão que a concepção do Natal permanece como um poderoso pilar de luz no meio o sentimento cósmico cristão."
As forças de Nascimento do Pilar da Festa Natalina permeiam a atmosfera, nos convidando anualmente a vivenciar este pensamento de que nossa origem é espiritual e relembrar esta origem de forma Viva, e não apenas intelectual.
Mas como nos aproximar deste pilar, desta atmosfera natalina repleta de forças curativas e restauradoras de maneira verdadeira, em tempos tão árduos? Essa pergunta, que cabe para todas as demais festas, não é simples de se responder e tampouco tem respostas absolutas, receitas prontas e infalíveis. O que sabemos é que a busca desta aproximação se trata de construção (em especial para nós adultos), caminho feito com paciência, ano a ano, tijolo a tijolo, cultivo de preciosa semente. Não vem pronta de forma instantânea e sim gradualmente, como tudo o que é vivo. E nesta busca, nesta construção e cultivo, encontramos na Antroposofia uma aliada maravilhosa que nos traz imagens e esclarecimentos generosos.
E quais imagens podemos então movimentar na Alma no intuito de buscar conexão com este lindo e amoroso Portal do Nascimento? São inúmeras as imagens relacionadas ao Natal, escolho aqui três delas: O nascimento, a visita dos pastores e a visita dos Reis, mencionados no verso no início deste texto.
Vamos começar e terminar nosso caminho pelo Nascimento, Steiner menciona que Natal e Páscoa formam juntos dois portais, essenciais no desenvolvimento humano, Nascimento e Morte respectivamente. Não há como se relacionar com a verdadeira Vida sem a vivência destas duas qualidades. E o que podemos vivenciar através do portal do Nascimento? Tudo o que nasce, ou seja, que se manifesta aqui no nosso mundo material, tem sua origem em um mundo não material, espiritual. Nossa pátria é o Mundo Espiritual e qualquer nascimento, se contemplado com devida abertura anímica, leva a esta percepção: este Ser está aqui manifesto materialmente, mas sua origem não é material. O livro Inatalidade de Peter Selg nos convida para esta e outras profundas reflexões e pode nos ajudar nesta construção.
E então, diante deste maravilhoso Portal, Steiner nos convida a uma ideia fundamental para se movimentar nestes tempos Natalinos: “A desigualdade é criada pela existência física; no espírito os seres humanos surgem iguais perante o mundo e Deus e perante os outros seres humanos. Assim declara o mistério da criança.”
O fato de termos a mesma origem criadora, nos torna iguais. Steiner usa o exemplo das crianças menores, que quando ainda pequeninas, não se ocupam de se diferenciar por raça, condição social, gênero ou nacionalidade. Se portam como seres divinos e por isso equivalentes perante a criação. E que alegria é poder estar próximo a uma pequena criança que vivencia esta certeza inconsciente de sua origem espiritual.
E essa percepção de sermos criados do Amor e iguais perante ele, ou seja, irmãos, pode e precisa ser cultivada nesta época, tanto interna quanto externamente, pois o correr da vida impõe uma série de diferenciações, muitas vezes difíceis, por exemplo, diferenças sociais. E, estarmos atentos ao nosso entorno, atentos às vezes em que algum indivíduo carece ser tratado a partir desta visão da igualdade, deste olhar amoroso. Ações que relembram a todos nós de nossa origem e da dignidade da nossa humanidade.
Um exemplo perfeito do que acabo de descrever são os Pastores que visitam o menino Jesus: “Um pastor que ouve o que as outras pessoas não ouvem, e que com todas as formas da dedicação mora logo abaixo do céu estrelado. A esse pastor, anjos anseiam por revelar-se.”
Estes homens guardam, de maneira inconsciente e por isso muito profunda, a conexão com este portal do nascimento, a vivência de sua origem espiritual e por isso a igualdade entre si. Na descrição histórica desta visita não há destaque de individualidades e suas diferenças. São apresentados como um “um grupo de Pastores”. E nesta pureza de criança são capazes de ouvir o que os anjos “anseiam” por revelar. Estão próximos ao Divino menino e, a partir do anúncio do Anjo, se colocam a caminho rapidamente para oferecer lã, leite, farinha. Ação calorosa, capaz de ajudar a sustentar aquela Vida recém-chegada à Terra e neste sentido, igualmente frágil, similar a todos os seres humanos recém-nascidos.
Ao contemplar este ambiente pastoril podemos, nesta época Natalina ansiar e cultivar para que exista em nós um “Coração de Pastor”, bondoso e simples, capaz de ouvir o que os anjos anseiam por revelar e agir a partir desta escuta atenta e amorosa.
Mas existe um outro grupo, que embora mais distante, também se aproxima para visitar o Divino menino: Os sábios Reis: “E um rei que distribui dádivas, que não se deixa guiar por nada mais a não ser pela estrela das alturas. E que se põe a caminho para ofertar suas dádivas ao pé de uma manjedoura”.
A visita do Reis no leva a um ambiente anímico bem diferente dos pastores, os Reis nos são apresentados por seus nomes, Baltazar, Melchior e Gaspar, vêm de diferentes regiões, cada um tem seu próprio reino e atribuições de modo que cada um deles oferta um presente bastante específico e diferenciado: Ouro, incenso e mirra. Presentes que não são necessários para um bebê, mas que serão no futuro importantes para a o cumprimento da missão do Cristo Jesus.
Quando contemplamos os Reis vislumbramos, não o que nos iguala e sim o que nos diferencia. A esse respeito Steiner pontua algo muito interessante: o que realmente nos diferencia do ponto de vista humano são nossos dons, capacidades e aptidões. Somos, assim como os Reis, muito específicos no que podemos oferecer ao mundo como “presentes”.
E neste sentido, somos livres pois podemos fazer com nossas capacidades o que quisermos, deixando de utilizá-las, utilizando-as somente para fins egoístas ou ainda mirando no exemplo dos sábios Reis e “ofertando aos pés da manjedoura” na construção de um mundo melhor.
Neste sentido Steiner nos diz: “Além da inclinação da criança, da sua aspiração, à igualdade, fui dotado de várias capacidades e talentos. Mas podem levar permanentemente a bons resultados, ao bem-estar da humanidade apenas esses dons e esses talentos que são dedicados ao serviço de Cristo Jesus; somente se o ser humano se esforçar para permear toda a sua natureza com o Cristo, a fim de que os dons, talentos e gênios humanos sejam libertados das garras de Lúcifer.”
E podemos então na época do Natal, cultivar e aspirar por uma sábia e luminosa “Cabeça de Rei” que não se deixa guiar por nada mais a não ser pela estrela das alturas e que por isso sabe que deve ofertar seus dons e aptidões ao Amor.
Sobre isso Steiner nos convida a um lindo movimento: “Dirige-te, ó cristão, ao pensamento do Natal” - assim fala o novo Cristianismo - “e põe ali sobre o altar erguido para o Natal todas as diferenciações que recebeste do teu sangue como ser humano, e santifica as tuas capacidades, santifica seus dons, santifique até mesmo o seu gênio ao vê-lo iluminado pela luz que vem da árvore de Natal.”
E assim, cultivando a cada ano mais e mais em nossa Alma os nossos simples Corações de Pastores e as nossas sábias Cabeças de Reis, podemos gerar espaço interno para sermos agraciados com o nascimento desta Criança divina, verbo encarnado: “Luz Divina, Cristo Sol” em nossos corações.
Maria Cecilia Moraes Antunes, nascida em Minas Gerais, filha de um pai nordestino e de uma mãe mineira, 49 anos, mãe do Gabriel, engenheira química, mestre em físico-química e pedagoga curativa. Fundadora da Casa da Alma – Cosméticos Terapêuticos e professora nas formações de Medicina ampliada pela Antroposofia e Pedagogia Curativa.