Economia Associativa

Economia associativa é um termo usado de forma variada por diferentes pessoas ao redor do mundo. Para alguns deles, a obra do filósofo e pensador social austríaco Rudolf Steiner[1] é uma referência. Steiner deu uma série de palestras em 1922 nas quais expôs sua visão de que, com o advento da economia global, a ciência da economia precisaria dar um passo adiante, que incluía uma elaboração do processo econômico, uma análise monetária mais precisa, e uma compreensão mais clara de como, por meio da divisão do trabalho, a base associativa da vida econômica se torna aparente. A economia associativa enfatiza o desenvolvimento da coordenação consciente de produtores, distribuidores e consumidores. Ele entende a economia global como um único domínio unificado, por meio do qual os seres humanos atendem às necessidades uns dos outros. Chama-se "economia associativa" porque tem por objetivo um setor econômico gerido por associações de empresas (associações industriais) e associações de consumidores, e não pela "mão invisível do mercado" (economia capitalista) ou pelo governo (economia socialista). 

Fonte: Wikipedia


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Dieter Brüll

Tradução de Marco Berthalot

(fornecido pela Associação Elo)

Prefácio

A perspicácia e a precisão com as quais o autor analisa os principais fenômenos da economia garantem a atualidade do presente texto, apesar de escrito na década de 1970. O leitor terá que levar em conta esse fato quanto aos fenômenos, pois a realidade econômica naquela época era outra. Citemos, a título de exemplo, a queda do muro de Berlim como símbolo de transformações que ocorreram de lá para cá. Mas do ponto de vista da interpretação dos fenômenos e da direção do desenvolvimento econômico e social que tivemos desde então, o leitor poderá notar a força e a propriedade das análises. Fenômenos mais recentes como as megafusões de empresas apenas reforçam a linha de pensamentos que Dieter Brüll, jurista, cientista social e professor universitário em Haia, Holanda, trilhava há mais de 20 anos. O mesmo pode ser dito quanto às Associações Econômicas que, na sequência destas análises, aparecem como uma direção desejável para o desenvolvimento de uma economia que pretende ser mais ecológica e mais justa do que, até aqui, conseguimos realizar. (M.B.)


“O egoísmo saudável dos participantes do processo econômico garante que se produza exatamente aquilo que o consumidor exige. Os preços dos produtos tendem por si próprios para um mínimo, pois o livre jogo das forças econômicas - neste caso especialmente a concorrência entre empresas - se incumbe de fazer com que os preços do mercado aproximem-se cada vez mais dos custos de produção.”

Isto é o que afirma a ideologia da nossa estrutura social pseudocapitalista. Mas basta olharmos ao nosso redor para encontrarmos uma realidade completamente diferente. Do lado da produção, vemos uma crescente concentração (cartéis e fusões) que facilita a definição unilateral dos preços (determinação monopolista dos preços) e do pacote de mercadorias que é colocado à disposição do consumidor.

Pergunte-se, numa loja, onde estão aquelas meias que duravam tanto! Pergunte-se onde estão os relógios de bolso que o vovô usava, que duravam três gerações e que continuariam funcionando se o relojoeiro estivesse disposto a fazer o que diz que faz! Procure-se aquela calça que não ficava nem muito baixa na cintura nem muito apertada nas pernas! Todos conhecemos tais situações com aquela resposta estereotipada: “Ninguém compra mais esses produtos, por isso não são mais produzidos.” Mas será que podemos acreditar que o consumidor decidiu que não quer mais as meias duráveis, que não está mais preocupado com a calça confortável ou com um bom relógio ? A partir desse seu egoísmo saudável, o produtor nos entope com mercadorias que rapidamente se desgastam. O comprador de produtos descartáveis é aquele que mais rapidamente volta à loja. Esse fenômeno é bem conhecido. As diferenças de opinião só existem quanto à sua causa. Será que a estrutura econômica está enferma, ou será que o sistema em si é saudável, necessitando apenas de algumas correções (economia social de mercado)?

Concentração dos Produtores

Já temos mais de um século de experiências com fenômenos de concentração e também com o combate a essas concentrações. O país do “free-enterprise” já conhece a lei anti-truste desde 1890. Mas onde é que encontramos “the biggest companies of the world” (as maiores companhias do mundo)? Na Comunidade Econômica Europeia consegue-se desfazer um cartel, mas ao mesmo tempo surgem outros dez em seu lugar. Esses fenômenos não são meros desvios esporádicos, como nos querem fazer acreditar os políticos comprometidos com o capital. Todo professor sabe que Joãozinho pode atrasar-se uma, duas ou até três vezes. Mais do que isso, significa que o problema está com Joãozinho e não nas coincidências que parecem justificar os atrasos. Da mesma forma podemos entender a tendência à concentração, à formação de posições de poder econômico e de monopólios, que são inerentes ao sistema econômico atual. Toda tentativa para manter esse sistema e, ao mesmo tempo, evitar as concentrações, está fadada ao fracasso. Uma estrutura econômica que adota o princípio do egoísmo como seu ponto de partida, terá que aceitar que os produtores se reúnam para fazê-lo valer. E seria um erro atribuirmos a tendência à concentração a uma conspiração dos produtores. Que assim fosse! O aspecto fatal da estrutura econômica atual é justamente o fato de que o consumidor depende totalmente da atividade dos produtores e que estes fracassariam na luta pela sobrevivência se não o explorassem. A única distinção que podemos fazer, neste caso, é diferenciar os produtores que participam desse jogo com entusiasmo daqueles que o fazem a contragosto. A boa vontade do empresário encontra limites estreitos. O atendimento ao consumidor, as garantias e demais serviços, são meras manifestações periféricas. E a que devemos isso?

O problema é multifacetado e demasiadamente complicado para ser tratado em apenas um artigo, mas devemos abordar os aspectos principais para podermos esclarecer o que queremos dizer com o termo associações. Em primeiro lugar, podemos chamar a atenção para a natureza do ser humano que, em geral, procura colocar os interesses próprios acima dos demais. Por outro lado, esse fato não precisa levar à catástrofe se a sociedade, com as suas instituições, conseguir colocar limites a esse egocentrismo . Mas o berço da revolução industrial nos legou a fábula de que uma “mão invisível” (do economista Adam Smith) faria com que o egocentrismo individual conduzisse ao maior bem estar de todos. As seguintes palavras de Franz Josef Strauss (um político alemão), proferidas ao estílo dos antigos oráculos, representam um eco macabro e atrasado desse fato: “Pessoas como Flik e Kint (que em poucos dias ‘faturaram’ milhões) são o preço que pagamos para estarmos passando bem”. A partir dessa filosofia, parece não existir motivo para se introduzir, nesse sistema, algum tipo de medida que contenha o comportamento antissocial.

Sabemos que a natureza do ser humano tende a uma instigação emocional crescente e autoalimentada, quando pessoas se agrupam em função de interesses comuns. Não é preciso estudar psicologia de massas para entendermos o extremismo de determinados clubes políticos ou de reuniões de representantes da classe média ou, ainda, de trabalhadores em greve. Esse tipo de fenômeno é favorecido pela estrutura econômica que criamos; ela põe todos num mesmo saco.

Os sindicatos patronais impostos na Holanda durante a ocupação alemã, por exemplo, foram desfeitos logo após a libertação, mas logo depois foram reintroduzidos com metas e nomes aparentemente diferentes. Na maioria dos países industrializados, deve ter ocorrido algo semelhante. Nem uma criança acreditaria que esta forma de organização cria um parceiro menos complicado para o diálogo com o estado. Essa mesma frente unificada e fechada, também é apresentada, para o diálogo, aos sindicatos dos trabalhadores e aos consumidores. Desta forma fortaleceram-se apenas as forças egocêntricas. Os participantes dessas organizações também não as estranham e, a cada passo, encontram bons e justos motivos para a sua existência. É que também não existe ninguém nessas reuniões que traga um argumento contrário. E assim acrescenta-se, ao egocentrismo, também o poder. A partir dessas considerações resulta o primeiro princípio que, na ideia da sociedade trimembrada, é considerado básico para a economia: “Não se baseiem na ilusão de que o ser humano é um ser altruísta. Aceitem que, do ponto de vista econômico, as suas ações estão permeadas por interesses próprios.” Justamente por isso é necessário que se reúnam para a cooperação e para o trabalho em conjunto, não as pessoas com os mesmos interesses, mas sim aquelas que representam interesses opostos. Quando interesses opostos aparecem em sua interdependência do ponto de vista estrutural, possibilita-se o surgimento de uma compensação mútua; e aí sim, podemos esperar um equilíbrio aceitável para a sociedade como um todo e não apenas para aqueles diretamente interessados.

Quem decide o que se produz ?

O segundo aspecto da nossa estrutura econômica atual é que o empresário decide, de maneira autônoma e unilateral, o que será produzido. Isso certamente não ocorre sem informações sobre os processos técnicos, sobre os custos de produção, sobre as mercadorias dos concorrentes, sobre as possibilidades de financiamento e, cada vez mais, também sobre a demanda efetiva do mercado. “O que é que eu posso vender, a que preço, com que meios e em que prazo?” Com tudo isso passa-se a impressão de que assim está garantido o ajuste entre a produção e as necessidades dos consumidores. Os defensores da ordem econômica atual insistiram sempre sobre o fato de que só é possível produzir se existe demanda. Mas como se explica que, cada vez mais, se instala no consumidor a sensação de que ele não pode comprar o que de fato quer?

Muitas linhas de produção foram montadas porque, sem dúvida, existia a necessidade correspondente: um empresário farejou alguma forma de ganho. Mas com isso dá-se início a um processo que segue as suas próprias leis. É bem possível que o volume e o ritmo da demanda, por exemplo, não tenham sido avaliados corretamente. E a causa desse erro pode ser encontrada tanto no empresário, que pode errar nas suas avaliações, como também nos desejos imprevisíveis do consumidor. Mas o fato é que o empresário, nestes casos, não estará disposto a arcar com o prejuízo daí resultante; ele buscará todos os meios para estimular o consumo e aumentar o faturamento.

Essa forma de “produzir sem demanda” ainda é uma manifestação bastante inofensiva do fenômeno. Mas isto muda completamente quando o fenômeno se torna parte do sistema. Sabemos que a produção das empresas tende ao excesso: a produtividade das máquinas é praticamente ilimitada e com o aumento da produção ocorre uma diminuição dos custos. É a famosa “lei das economias de escala”.

O aumento da produção recebe um empurrão adicional quando se adquirem máquinas destinadas a executar trabalhos que não aproveitam toda a sua capacidade produtiva. A tendência será inventar novos produtos que possam ser fabricados com tais máquinas.

Algo semelhante ocorre quando o processo de produção gera subprodutos. “De que forma podemos aproveitar estes restos para levá-los ao mercado?” Um bom exemplo nos é dado pela propaganda intensiva que a indústria de alumínio faz, dizendo que deveríamos acrescentar flúor à água. O flúor é um subproduto bastante tóxico da produção de alumínio, e a sua eliminação gera altíssimos custos. “Como é bom poder transformar esses custos em lucro, convencendo os governos a adicionarem flúor na água potável, mostrando-lhes que sem essa adição eles estariam deixando de cumprir a sua responsabilidade perante os dentes das crianças.” A questão de como vender bens sem a existência prévia da respectiva demanda, tem um lado técnico que está presente quando mercadorias são produzidas com vida útil propositalmente limitada, obrigando o consumidor a voltar mais frequentemente à loja. Mas também há o lado da psicologia aplicada, através da qual se faz o consumidor comprar o que na verdade ele não quer. Este princípio pode ter sido descoberto quando a capacidade produtiva das máquinas ainda era mal aproveitada, mas agora também pode ser adotado de forma independente. O significado de seu efeito pode ser avaliado pela redução para um terço do faturamento habitual dos supermercados, em Nova Iorque, durante uma greve dos jornais. Talvez possamos deduzir, daí, que nesse caso as necessidades dos consumidores têm um componente não autônomo de aproximadamente dois terços, ou seja, dependem dos estímulos artificiais dos anúncios diários.

Com a questão dos supermercados, passamos do produtor para o comerciante. Em nossa estrutura atual, o comerciante é uma extensão do braço do produtor. Através das mais diversas formas ele é estimulado a vender aqueles produtos que lhe oferecem maior lucro. Mas essa forma de empurrar as vendas também é estimulada a partir de um outro lado: a forma de financiamento. Para conseguir créditos, o empresário não tem que comprovar a existência de uma demanda concreta; basta ser convincente a respeito da possibilidade de estimular a demanda. É como diz o eufemismo científico: existe uma “demanda em potencial”.

Mas o empresário também quer libertar-se mesmo desse controle mínimo, acumulando um patrimônio próprio a partir do acúmulo dos lucros. Esse patrimônio adquire vida própria. Ele exige rentabilidade e quer ser aplicado em novos investimentos, tanto na própria empresa como em pesquisa industrial ou na compra de outras empresas. Uma grande parte da depreciação das empresas não é destinada mais a pagar dívidas, mas apenas para a ampliação do patrimônio. Esse fato representa mais um estímulo para a realização de investimentos, que podem ocorrer sem nenhuma relação com a demanda. A imagem que se forma a partir destas análises é a de um aparelho de produção poderoso que, através de vários canais, bombeia as mercadorias para cima do consumidor. É justificado até perguntarmos se o consumidor não assume a responsabilidade por essa situação, ao absorver esse fluxo de mercadorias. De certa maneira temos que aceitar uma resposta afirmativa. Uma greve dos consumidores traria à luz quais as necessidades que, de fato, estão sendo satisfeitas.

Mas será que podemos aceitar essa exigência de uma postura tão consciente do consumidor quando vemos que, ao mesmo tempo, o induzimos a desenvolver dependências anímicas e, frequentemente, até físicas, através da utilização de meios científicos refinados? Além disso, a mídia de massa depende financeiramente da propaganda industrial. E isto obviamente impede que se debatam abertamente esses métodos tão disseminados em nosso sistema econômico!

Ajuda estatal ou movimento de consumidores?

Então aqui teríamos uma tarefa para o Estado? Certamente, mas apenas em parte. Seria desejável, por exemplo, que o Estado fosse mais rigoroso quanto aos limites na aplicação de penalidades. Também o campo do direito civil deixa a desejar, mesmo diante do grande trabalho que já foi realizado neste campo pelas associações de consumidores. Nos Países Baixos, por exemplo, elas conseguiram impor regras que protegem o comprador contra métodos agressivos de venda. Elas também garantem apoio jurídico gratuito a seus associados. Elas também procuram contrapor-se a propagandas enganosas. Muito também poderia ser conseguido se o Estado garantisse a livre informação como parte integrante de uma vida espiritual livre. Somente aqueles que podem pagar bem gozam da possibilidade de fazer circular as informações. Poderíamos imaginar algo como o direito de publicar opiniões que contrariam informações veiculadas incorreta ou unilateralmente. Como consequência, teríamos uma maior distinção entre os interesses econômicos e os espirituais, por exemplo, entre a direção e a redação de uma revista.

Não podemos ter uma expectativa muito grande. Em geral, quando se trata de questões econômicas, encontraremos o Estado posicionando-se do lado dos interesses dos produtores. É muito frequente encontrarmos o governo funcionando como extensão do braço dos interesses de quem vende. E isto não precisa sempre acontecer de maneira grosseira, como no caso daquele ministro americano ao declarar publicamente que aquilo que é bom para a General Motors também é bom para a América.

Talvez nos lembremos ainda daquela situação em que um ministro do mesmo país chamou a atenção para os seus concidadãos, dizendo que teriam que adquirir todo ano um novo automóvel para serem considerados americanos patrióticos. Mas esse tipo de fenômeno não ocorre somente no exterior. Em todos os países é possível produzir uma longa lista de casos nos quais o governo conseguiu, através de refinamentos jurídicos, confrontar a população com fatos consumados, por exemplo, quanto à implantação de uma unidade industrial que a população não queria. As companhias aéreas nacionais geralmente representam uma somatória conveniente entre os interesses do Estado em mostrar a sua bandeira e os interesses da indústria. As necessidades dos respectivos passageiros, é claro, ficam em segundo plano. A maioria dos serviços aéreos, aliás, são mantidos por impostos. Também já mencionamos a relação entre a indústria de alumínio e a propaganda estatal em favor de adição do flúor na água potável. Fica claro, portanto, que do Estado não podemos esperar muita ajuda. O consumidor terá que "virar-se" por conta própria.

Aqueles que defendem o ponto de vista de que a economia aí está para servir aos seres humanos e não ao contrário, deverá, pelo menos, teoricamente, reconhecer que o centro de motivação da estrutura econômica atual se encontra no ponto errado; a indústria não deveria empurrar as mercadorias para cima do consumidor, mas, pelo contrário, os consumidores devem representar a força de sucção que movimenta a indústria para a produção. Desta forma descrevemos o princípio que embasa a vida econômica numa sociedade trimembrada.

Não será possível evitar medidas rigorosas se realmente quisermos que as necessidades do consumidor ocupem o centro das ações econômicas. Não será suficiente ter o "santo desejo", nem tampouco contentarmo-nos com a justificativa a posteriori: "o mercado absorveu as mercadorias, portanto a necessidade existe". Do ponto de vista do consumidor será necessário levar a sério as suas intenções de compras, quando formuladas com toda consciência, de maneira que o produtor poderá, ao planejar os seus investimentos, contar com a respectiva demanda. Isto significa que a relação entre a oferta e a demanda pode adquirir, eventualmente, um caráter de contrato de longo prazo. E o consumidor não prejudicará ninguém se transferir para terceiros um compromisso de compra anteriormente assumido. É ineficiente e caro forçar o produtor a arcar com os prejuízos resultantes de compras que acontecem ao "bel prazer" do consumidor. Da mesma forma, é ineficiente adaptar o consumo à estratégia de mercado dos produtores. Representantes de consumidores devem estar atentos para que a qualidade acordada também seja fornecida.

O lado da produção não pode tornar-se independente da demanda. Um dos caminhos que pode ser trilhado com essa finalidade consiste em transferir os meios de produção da esfera da propriedade para a esfera do direito contratual. E com relação a essa 'desprivatização' do capital de produção, ainda existe a seguinte questão: enquanto uma ciência inteira se ocupa com os custos de produção das mercadorias e os custos dos serviços, prefere-se não falar do preço da oferta, que é o preço de venda. A filosofia econômica aconselha a produzir "o que o mercado absorve". Mas mesma forma, ela aconselha uma política de preços que promete o maior resultado possível. Dependendo do setor, essa concepção desemboca em proibições de fornecimento, "dumping" e preços que perdem qualquer relação com os custos de produção. Outras consequências são a definição vertical de preços ou a sua definição a partir de aspectos ligados à qualidade, vendas casadas etc. A concorrência de preços, considerada indecente, fica cada vez mais restrita à prática comercial entre varejistas. Mas, por outro lado, temos a infelicidade de que a concorrência forma o fundamento teórico da estrutura econômica atual.

A política de preços faz parte dos segredos empresariais mais bem guardados. O consumidor não sabe nada a respeito. Somente quando ocorre a destruição pública das mercadorias visando evitar maiores quedas dos respectivos preços é que aparecem os moralistas "abstratos" com os seus protestos. "Abstratos" porque finalmente veem as mercadorias em vez dos lucros. E "moralistas" porque se exaltam pelos estômagos vazios que poderiam ter sido forrados com a colheita destruída.

Quanto pode custar uma mercadoria?

Um consumidor que quisesse celebrar um contrato de fornecimento com um fabricante deveria conhecer a estrutura de custos da respectiva mercadoria. Mas esta não é a única dificuldade pois ele poderia consegui-la a partir da sua posição de vantagem na negociação. Em primeiro lugar, ele deve saber quais os elementos que fazem parte do preço. Como o valor de uma mercadoria pode ser determinado? A seguir quero apenas tocar nos pontos principais desta questão.

a) A escassez, por exemplo, deve ser incluída na formação do preço, além do trabalho necessário para produzir uma determinada mercadoria? Já faz aproximadamente um século que as ciências econômicas transformaram a demanda, ou o grau de escassez, no pilar de suas teorias de preços. É óbvio que estes economistas responderão afirmativamente. Por outro lado, ocorre que as soluções, em situações emergenciais como, por exemplo, algum problema com o balanço de pagamentos, são buscadas através da fixação pública ou disfarçada dos respectivos preços. E nas situações em que a escassez é periclitante, por exemplo quando há fome, passa-se a distribuir alimentos e outros produtos básicos somente mediante a troca por "selos" ou cupons. Hoje em dia justifica-se perguntarmos se a situação de emergência não passou a ser permanente e se, nesse caso, não se justificaria excluir definitivamente a "escassez" como elemento participante da formação do preço.

b) Como pode o fator ‘trabalho’ encontrar a sua expressão no preço ? Quanto mais o valor dos salários se tornar uma questão jurídica (salário mínimo, salário teto, pagamentos baseados em leis ou acordos coletivos), tanto mais fortemente apresentar-se-á a pergunta sobre como se justificam as atuais diferenças entre os salários. Geralmente estas se dão mais em função da posição de poder do que em função da escassez de determinadas habilidades.

c) Enquanto permitirmos que as empresas aumentem o seu capital ilimitadamente (reservas), devemos perguntar-nos se o preço das mercadorias também devem incluir a rentabilidade sobre o patrimônio. Ao agirmos desta forma - o que corresponde ao que a teoria econômica recomenda – estamos, de fato, forçando o consumidor a financiar a febre expansionista do produtor.

d) Cada vez mais os preços acabam também incluindo um adicional para a pesquisa. Os preços mais agressivos, como os da indústria farmacêutica, são camuflados por este item. Do ponto de vista da sociedade como um todo, trata-se de um desperdício muito grande, pois o resultado da pesquisa livre deveria estar à disposição de toda a humanidade. Esse tipo de anexação, pela indústria, de parte da vida espiritual (à qual pertence a pesquisa), produz um déficit na vida espiritual que depois tem que ser compensado por impostos. Desta forma, portanto, forçamos o consumidor a pagar através dos preços. Sendo que resultados dessa pesquisa só serão aproveitados se o produtor tiver uma perspectiva de lucro ou vantagem para si. Resultados de pesquisas que poderiam tornar um produto mais resistente ou que levariam à concorrência com um produto já existente, ficam no cofre.

Assim descrevemos o terceiro princípio que, do ponto de vista de uma concepção trimembrada da sociedade, forma a base da vida econômica: a conscientização do valor das mercadorias.

O que são, enfim, as associações?

Steiner chamava de associações o espaço funcional, ou órgão, onde estes três princípios - a avaliação conjunta dos interesses opostos, tomar como ponto de partida a necessidade do consumidor e a determinação do real valor da mercadoria - pudessem ser realizados. Não deveríamos pensar num lugar fixo; portanto, não se trata de um instituto com funcionários, mas apenas de um espaço de encontro

- no qual uma demanda concreta encontra uma oferta potencial concreta;

- onde o comércio, através do conhecimento a respeito do que é produzido e do que pode ser produzido, não seja mais apenas um porta-voz dos produtores, mas exerça de fato a função de intermediação;

- onde se forma o preço justo que, a partir da experiência e do conhecimento de causa dos envolvidos, pode se tornar também um preço mais em conta;

- onde se elaboram as informações necessárias para a celebração de contratos, os quais, por sua vez, poderão servir de base para a concessão de empréstimos que viabilizem os investimentos necessários.

Não seria correto pensar-se que o que aqui se descreveu como o princípio ordenador básico da vida econômica foi desenvolvido em resposta aos fenômenos que abalam a vida econômica atual. As associações também podem ser entendidas como resultantes das próprias leis que regem a economia. As duas formas de se chegar à conceituação das associações - tanto a partir das leis da vida econômica quanto a partir dos atuais abalos da economia - necessitam da complementação que se dá a partir das experiências práticas. A experiência prática permite criar os corretivos necessários às unilateralidades da teoria. Ao mesmo tempo, ela também se incumbe de trazer novos problemas bem diferentes e também novas soluções.

 

Mas existe um último ponto que tem que ser esclarecido. Os mencionados abalos e desequilíbrios da economia provocaram interferências significativas do Estado em vários setores. Para respondermos à pergunta se esta interferência do Estado não seria uma alternativa viável para as associações econômicas, será necessário primeiramente formarmos uma imagem, uma representação do que é possível esperarmos da interferência estatal.

No item anterior, mostramos como as ações econômicas do Estado em geral se baseiam no ponto de vista da produção. O melhor exemplo, neste caso, é o da agricultura, que foi totalmente regulamentada, até mesmo internacionalmente. O porte das empresas agrárias é definido a partir de critérios de maximização econômica, com maximização da mecanização. Com a ajuda de subsídios estatais (atualmente, na Holanda, paga-se para erradicação de pomares) e sob pressão econômica, liquidam-se as pequenas empresas. Nestas questões, nem entra em consideração a pergunta a respeito das necessidades do consumidor. A variedade da oferta cedeu ao produto padronizado que as instâncias governamentais nos impõem. Essa realidade apenas foi um pouco maquiada pela importação de produtos alternativos. Com esse tipo de ação, o Estado terminou por assumir a condução do mercado agrário, justamente aquele setor da economia que, por maior tempo, manteve a filosofia liberal capitalista. Estamos nos referindo ao mercado atomizado, no qual os compradores e os vendedores individuais não têm como influenciar o preço dos produtos. Em consequência, esses preços tenderiam a aproximar-se dos custos de produção. Na agricultura, o Estado assumiu em suas próprias mãos o papel de determinar o que é bom para o consumidor, como ocorre com as grandes empresas nos outros setores da economia.

Mas não nos iludamos! Este é apenas o início de um desenvolvimento. A poluição ambiental que, em grande parte, se deve ao desperdício dos métodos de produção, deve ser mantida dentro de certos limites. E isto exige controle e supervisão. Estas funções, por sua vez, favorecem, quando não impõem, a concentração da produção e a uniformização dos produtos.

FreqUentemente procura-se descrever a diferença entre a economia ocidental empresarial e a oriental planificada, dizendo-se que uma se organiza em função dos pontos de vista dos empresários e a outra em função de motivos político-partidários. Mas ambas definem o que o consumidor acabará recebendo. Os aspectos relacionados à questão da poluição ambiental já forçam a estruturação da economia ocidental de tal forma que o Estado acaba definindo o que será produzido/consumido, baseando-se, para tal, em critérios técnicos e tecnológicos. Interferência estatal, portanto, não pode substituir uma economia associativa; esta, no entanto, pode, sem dúvida, ser considerada uma alternativa desejável à tecnocracia.

Mas será mesmo uma alternativa real? Isto depende do que imaginamos. É óbvio que não seria realista pensar-se que um mero pensamento alternativo poderia frear o "rolo compressor" da tecnocracia. No entanto, não me parece acaso o fato de que as tentativas de introduzir formas econômico-associativas ocorrem justamente no campo da agricultura, onde também a interferência estatal provocou a maior padronização da oferta. Um bom exemplo, no entanto, pode facilmente ter um efeito multiplicador. Enquanto as experiências alternativas conseguirem fechar razoavelmente o ciclo de mercadorias entre produtores, comerciantes e consumidores, e enquanto houver um pouco de coragem civil para não capitular diante da primeira dificuldade, também as interferências das autoridades serão improváveis. O perigo, nestes casos, geralmente surge mais de dentro: a regressão para os velhos hábitos capitalistas que, no decorrer dos últimos séculos se afirmaram, formando como que uma segunda natureza dentro de nós. Penso, por exemplo, no comerciante que, com as melhores intenções, assume o papel de médico ao induzir o cliente para a compra "porque o produto e tão bom para a sua saúde".

Com isso, caracterizamos a base da economia associativa: os tempos de manipulação do consumidor - e isto todos nós somos - já passaram. Após a libertação da vida espiritual e da vida dos direitos, agora também a vida econômica quer se tornar autônoma.

Associações são possíveis somente quando os consumidores se tornam conscientes do seu papel e da sua tarefa na vida econômica; quando quiserem saber o que existe para ser comprado e quais os materiais utilizados para a sua fabricação, ou quais as condições sociais sob as quais foram produzidos, ou seja, se o consumidor estiver consciente das responsabilidades que assume ao gastar o seu dinheiro. O consumidor certamente não é o culpado pela selvageria econômica do presente, mas como comprador ele é certamente corresponsável e será sua a tarefa de transformar a estrutura da economia.